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Startups: novidades tecnológicas e trabalhistas

Segundo a Associação Brasileira de Startups (ABStartups), o Brasil tem atualmente 10.936 startups espalhadas por 536 cidades. No ano anterior, esse número era de 5.147 empresas. Esse mercado está amadurecendo ano após ano, tanto é que, no ano passado, tivemos os primeiros unicórnios brasileiros (startups que valem mais de US$ 1 bilhão): o aplicativo 99 e o Nubank.

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Startups estão revolucionando o mercado consumidor e o mercado de trabalho

Mas as mudanças que essas empresas trazem para o mercado brasileiro não estão apenas na forma de consumo e nos modelos de negócios. Essas startups estão mudando também a forma, o local e as horas de se trabalhar, desencadeando alterações importantes nas relações de trabalho que ainda nem estão previstas na Lei.

Você já parou para pensar na profissão de quem dirige para a Uber? Ele é empregado? Ou é apenas um prestador de serviço terceirizado? Ou será que é um trabalhador autônomo que usa a Uber para encontrar clientes?

Esse tipo de pergunta já causou muitas disputas judiciais entre a Uber e seus motoristas, tanto aqui no Brasil como em países como Estados Unidos e Reino Unido. E, em geral, levam a conflitos longos que se arrastam por anos e rendem muitos recursos na Justiça.

Uber versus motoristas: há vínculo trabalhista?

As várias ações contra a Uber já criaram alguns precedentes. No Reino Unido, motoristas ganharam uma ação contra a empresa no ano passado. O Tribunal de Apelação do Reino Unido manteve a decisão tomada em 2016 de que esses motoristas não eram empreendedores, mas sim empregados contratados. E essa vitória lhes rendeu o recebimento de direitos trabalhistas básicos como garantia de salário mínimo, direito a férias remuneradas e o não desconto de salário por motivo de doença.

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Já existem disputas judiciais entre motoristas e o aplicativo da Uber sobre vínculo empregatício

Mas será que os ganhos dessa vitória fizeram sentido? Afinal, o motorista do Uber pode ter férias (não remuneradas) quando quiser e se ficar doente, não é obrigado a trabalhar. Seu salário depende do número de viagens que ele faz e não há um número mínimo de horas de trabalho exigidas pela empresa.

Um caso como esse ocorreu também em São Paulo. A 17ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região também considerou, numa decisão de segunda instância, que existe vínculo empregatício entre a Uber e seus motoristas. A empresa foi condenada a assinar carteira de trabalho do motorista que entrou com a ação, além de arcar com todos os benefícios previstos na CLT.

Se, por um lado, os motoristas e advogados de defesa afirmam que as regras da Uber, que os motoristas têm de seguir, são indício de como a empresa tem controle sobre o serviço dos condutores. Por outro, a Uber argumenta que é apenas uma ponte entre o prestador de serviços e o cliente. Ela afirma que eles são totalmente independentes e não são subordinados à empresa. O motorista pode recusar viagens, não há metas, não há mínimo de viagens ou horas, nem é necessário justificar faltas.

Porém, há quem entenda que a definição da tarifa cobrada, os critérios de punição caso seja mal avaliado, o tipo de veículo usado e o padrão de comportamento são indícios de que há vínculo de trabalho. Além disso, o contrato da Uber com seus motoristas atende a pressupostos da lei trabalhista que definem o vínculo de trabalho:

1- Há relação entre empresa e pessoa física;

2- Pessoalidade: só o motorista pode realizar o trabalho;

3- Onerosidade: a remuneração é feita pela empresa;

4- Não eventualidade: o serviço não é prestado de forma esporádica;

5- Subordinação: os condutores têm de respeitar as regras da Uber.

Só no Brasil, há mais de 600 mil motoristas trabalhando para a Uber, em mais de 100 cidades, atendendo a mais de 22 milhões de usuários. Imagine se de uma hora para a outra, todos esses motoristas decidem entrar com uma ação contra a empresa?

Por que startups devem se preocupar com ações trabalhistas

Esse tipo de discussão não cabe só a Uber, mas também a outras startups que estão crescendo nos últimos anos como iFood, Rappi, Loggi e AirBnB. Todas com modelos de serviços colaborativos parecidos: elas fornecem um aplicativo que une prestador de serviço a consumidor via tecnologia.

No caso do iFood, a empresa une restaurantes a consumidores via motoboys que muitas vezes não tem vínculo de trabalho nem com o restaurante, nem com o iFood. Já o AirBnB, une uma pessoa que tem uma casa ou apartamento vago, por exemplo, numa praia paradisíaca, a um turista que quer estadia nesse mesmo local. Tudo isso quase que sem contato entre as partes, sem burocracia e muitas vezes sem nem ver quem está do outro lado do aplicativo.

Modelos novos de negócios, como esses acima, trouxeram grandes mudanças para o conceito de trabalho convencional. Surgiram novas oportunidades e diferentes perfis de carreira que não cabem mais no padrão do Art. 3º da CLT que define o que é empregado.

Então se você tem uma startup ou investe em uma, é bom ficar de olho nas relações de trabalho que ocorrem dentro da sua empresa. Existem alguns critérios que definem diferentes relações de trabalho que podem ajudá-lo a se guiar em relação ao seu quadro de empregados.

Para evitar ações trabalhistas, é importante que sua startup tenha à disposição uma boa assessoria jurídica que evite problemas em vez de resolvê-los quando a disputa já chegou à Justiça.

Quais modelos de contratação sua startup usa?

O conceito formal de contrato de trabalho é um negócio jurídico em que o empregado, pessoa natural, presta serviços de forma pessoal, subordinada e não eventual ao empregador, recebendo como contraprestação, a remuneração. Esse tipo de contrato é sinalagmático, isto é, envolve direitos e obrigações de ambas as partes.

O empregado coloca à disposição do empregador sua força de trabalho e se compromete a cumprir as regras fixadas no contrato, bem como as decorrentes da lei. Do outro lado, o empregador deve remunerar o empregado e cumprir as normas contratuais, coletivas e legais referentes ao contrato.

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Startups devem estar atentas aos tipos de contratos de trabalho

Para o empreendedor que está comandando uma startup, é interessante saber os diferentes modelos de contratação de empregados. O trabalho pode ser presencial, temporário ou ainda do tipo teletrabalho, sendo este último especialmente importante no mercado de startups.

A relação de emprego entre trabalhador e empresa ocorre somente se houver alguns elementos que caracterizam a relação de trabalho, como exemplificados acima no caso Uber.

Prazos do contrato de trabalho

Os prazos de um contrato também podem variar, mas a regra geral é a presunção de que o contrato vale por prazo indeterminado. Para contratar alguém por prazo determinado é necessário que haja algumas hipóteses como ser um serviço de natureza ou transitoriedade que justifique a predeterminação do prazo, por exemplo, a época de Natal em que lojas de shoppings contratam vendedores temporários para atender a demanda maior de consumo ou no caso de usinas que fazem contratos de safra.

Também é permitido no caso de atividades empresariais transitórias como no caso da Copa do Mundo no Brasil, em que empresas foram criadas apenas para atender aquele evento específico. E o contrato de experiência de um empregado novo também possui prazo predeterminado para que as partes se conheçam. Neste último caso o contrato pode ser de até 90 dias, já nos outros dois primeiros eles devem ter até dois anos de validade.

No caso do Uber, o motorista começa a trabalhar assim que se apresenta de acordo com as regras da empresa. E essa relação pode acabar a qualquer momento, caso o motorista seja mal avaliado por determinado número de usuários, mas também se ele apenas resolver deixar de dirigir para a empresa. Isso tudo sem nenhuma multa, nem ônus financeiro para nenhuma das partes.

Três tipos de trabalho

Trabalho temporário

Trabalho temporário é aquele prestado por pessoa física contratada por uma empresa de trabalho temporário que a coloca à disposição de uma empresa tomadora de serviços. Essa pessoa atende à necessidade de substituição transitória de pessoal permanente ou à demanda complementar de serviços. O motivo da contratação temporária deve constar expressamente no contrato firmado entre a empresa de trabalho temporário e a tomadora dos serviços.

O prazo para esse tipo de contrato é de 180 dias e pode ser prorrogado por mais 90 dias. E o descumprimento dos requisitos para a contratação de trabalho temporário gera vínculo de emprego diretamente com o tomador do serviço, o que pode render ações trabalhistas inesperadas. Neste caso, a empresa tomadora dos serviços é responsável subsidiária pelas obrigações trabalhistas referentes ao período que tiver sido beneficiada pela prestação de serviços do empregado.

Teletrabalho

Muita gente acredita que trabalhar em casa é um sonho. Nada de pegar trânsito, não há burburinho de escritório e tem todo aquele conforto: “Não há lugar como o nosso lar.” Ao longo dos últimos anos, as empresas foram aderindo a esse tipo de trabalhador remoto, principalmente em empresas de tecnologia.

Apesar de existir há algum tempo, o teletrabalho foi regulamentado apenas após a Reforma de 2017 (Lei 13.467/2017). No texto, ele foi caracterizado como a prestação de serviços para o empregador fora do ambiente da empresa. O empregado pode fazer home-office ou trabalhar em qualquer local externo ao ambiente da empresa, mediante o uso de tecnologia (informática), redes de telefonia, internet, e outras formas de telecomunicação e comunicação à distância.

Esse modelo é interessante para startups que estão começando e têm uma estrutura enxuta, flexível e que permite maior autonomia para os empregados. Além disso, ela tem certa economia desde a conta de eletricidade, além de não precisar dispor de um local para o indivíduo, sem contar a energia e disposição do indivíduo que não perde tempo nem tem o trabalho de se locomover até a empresa. Ainda assim, os pressupostos jurídicos para esse tipo de trabalho são os mesmos do convencional. Porém, o trabalhador não está sujeito ao controle de horário como ocorre com trabalhadores externos e aqueles que exercem cargo de confiança.

O empregador pode ainda alterar o regime de teletrabalho para presencial, se houver acordo entre as partes registrado em aditivo contratual. E, se o trabalhador tiver de realizar atividades específicas na empresa, como uma reunião, por exemplo, não há descaracterização do teletrabalho.

Mas a regulamentação não define quem deve arcar com a aquisição do equipamento e materiais utilizados pelo trabalhador. Esse ponto deve estar bem especificado em contrato para não acabar virando ação trabalhista contra a empresa. Nesse pacote, também entra os custos fixos como eletricidade, cobrança de internet e outras despesas.

Também entra na discussão o pagamento de vales como o de transporte e o de refeição. A justificativa para o vale é evitar o prejuízo para o trabalhador, ele funciona como um reembolso, mas nesse caso, se não há gasto com transporte, será que a empresa precisa arcar com esse custo? Daí a importância de estar atento à Lei para pagar corretamente as verbas trabalhistas nesse tipo de contrato.

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Trabalho intermitente

O contrato de trabalho intermitente também é interessante para startups que realizam projetos específicos durante um período. Por um lado, a empresa evita gastos com um trabalhador ocioso quando o projeto termina, mas por outro, esse tipo de trabalhador pode ter um custo mais elevado.

O trabalhador intermitente presta serviços de forma não contínua, havendo alternância de prestação de serviços e de inatividade, determinado em horas, dias ou meses, independentemente do tipo de atividade do empregado e do empregador. É quase como um freelancer fixo, mas com algumas regras específicas:

  • O empregador deve convocar o empregado, por qualquer meio de comunicação eficaz, para a prestação de serviços, informando qual será a jornada, com, pelo menos, três dias corridos de antecedência.
  • Recebida a convocação, o empregado tem o prazo de um dia útil para responder ao chamado, presumindo-se, no silêncio, a recusa.
  • A recusa da oferta não descaracteriza a subordinação para fins do contrato de trabalho intermitente.
  • Uma vez que a oferta para o comparecimento ao trabalho é aceita, a parte que descumprir, sem justo motivo, pagará à outra parte, no prazo de 30 dias, multa de 50% da remuneração que seria devida, permitida a compensação em igual prazo.
  • O período de inatividade não será considerado tempo à disposição do empregador, podendo o trabalhador prestar serviços a outros contratantes.
  • Ao final de cada período de prestação de serviço, o empregado receberá o pagamento imediato das seguintes parcelas: remuneração, férias proporcionais com acréscimo de um terço, décimo terceiro salário proporcional, repouso semanal remunerado e adicionais legais.
  • A cada 12 meses, o empregado adquire direito a usufruir, nos doze meses subsequentes, um mês de férias, período no qual não poderá ser convocado para prestar serviços pelo mesmo empregador.

Terceirização

A terceirização do trabalho também é uma forma comum de reduzir custos numa startup. Ela é caracterizada como a contratação de serviços mediante um contrato de prestação de serviços realizado por uma empresa que faz a ponte entre tomador de serviços e a mão de obra. E o contrato é firmado entre o prestador de serviço e a empresa fornecedora de mão de obra.

Até 2017, era permitido apenas a terceirização de atividades-meio das empresas, em geral serviços como limpeza e portaria. Mas após a alteração na Lei 6.019/74, com a publicação da Lei 13.429/2017, a terceirização de atividades-fim foi permitida. E em agosto de 2018, o STF declarou constitucional a terceirização de serviços na atividade-fim das empresas.

Contudo, a terceirização de certas áreas da empresa não é recomendável pelo nível de comprometimento de um trabalhador terceirizado. Em geral, startups prezam por um trabalho de qualidade e centrada no usuário, e dependendo do que a empresa busca no profissional, esse tipo de contrato pode não ser adequado.

Outros pontos importantes nas relações de trabalho em startups

Em geral, a estrutura de uma startup é horizontal, com menos burocracias e quase nenhuma hierarquia. Muitas vezes, nessas organizações a cultura é de criar um ambiente com trabalhadores independentes e multifunções que vestem a camisa da empresa.

No entanto, essa flexibilidade nas relações de trabalho em startups também abre caminho para futuras ações trabalhistas. Se a função de um empregado em uma startup não é bem definida, pode acabar rendendo ações por acúmulo ou desvio de função, uma razão frequente em processos na Justiça do Trabalho.

Além disso, com o uso de celulares pessoais, aplicativos de comunicação como WhatsApp e troca de mensagens fora do expediente, também tornou mais complicado definir qual horário o empregado está trabalhando e em qual momento está em seu lazer. Nuances como essas devem estar na mente de quem lidera uma startup e uma boa assessoria jurídica pode ajudar a empresa a caminhar dentro da Lei ainda que mantenha as características tão atraentes no estilo de trabalho das startups.

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